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Sustentabilidade futura da farmácia baseada em modelos de Value Based Healthcare (VBHC). Sim ou sim?



Saúde baseada em valor

Value Based Healthcare (VBHC) ou “Pagamento baseado em valor (PBV)”, o termo “da moda” cada vez mais utilizado no setor da saúde quando se fala em novas formas de financiamento e, por consequência, em sustentabilidade do setor. Quer seja na globalidade, quando olhamos para as propostas que visam não deixar “morrer” o SNS, quer seja nos restantes cuidados de saúde integrados no Sistema Nacional de Saúde, do qual as farmácias fazem parte.  

 

De forma resumida, VBHC tem como objetivo maximizar a qualidade dos cuidados de saúde prestados aos utentes, garantindo simultaneamente uma otimização dos custos totais dos tratamentos, ou seja, nesta abordagem muda-se o foco para o utente, onde a meta é fornecer a melhor qualidade de cuidados de saúde possível ao menor custo global. Modelos de VBHC assentam em 3 pilares: qualidade dos resultados, custos totais e consciencialização do utente através do seu envolvimento ativo nos próprios cuidados de saúde. O que é comum a todos? A possibilidade de serem medidos. Deixam de ter como foco o volume de utentes seguidos, passando antes a tê-lo nos resultados em saúde que estes demonstram – outro chavão utilizado, “outcomes em saúde”, quer sejam eles de adesão à terapêutica, controlo de doenças crónicas ou outros. 


Faz sentido falar em modelos baseados em valor nas Farmácias? Totalmente. Se pensarmos que é nos cuidados primários que está, indiscutivelmente, a componente mais crítica dos cuidados de saúde, então faz mais do que sentido. É sobre os cuidados primários que, pela sua acessibilidade e disponibilidade, recai a responsabilidade preventiva e de gestão de doenças crónicas, cuja intervenção permite evitar complicações a longo prazo.  

 

A Farmácia Comunitária, à semelhança de outros agentes no Sistema Nacional de Saúde, estão sujeitas a constante evolução, umas vezes por iniciativa própria, outras (na maioria das vezes) como resposta à evolução do mundo como o conhecemos. As alterações decorrentes da grande crise de 2010 ou situações como a COVID-19 são disso exemplo.  

 

A adoção de modelos de VBHC pelas farmácias comunitárias será uma necessidade, se não tomada de livre vontade, por uma questão de sobrevivência. Sobrevivência a dois níveis: margem dos medicamentos (a grande fonte de rendimento atual) e retenção de farmacêuticos (o maior dos seus problemas, como já tive oportunidade de abordar no artigo Como os recursos humanos se tornaram "O" grande desafio das farmácias). Na Farmácia Comunitária urge alterar o paradigma atual de um local de dispensa de medicamentos para um “hub de saúde”, onde além da dispensa de medicamentos a farmácia adote e promova cuidados baseados em valor. Dependente desta transformação, irá continuar a garantir a relevância e eficácia na prestação de serviços de saúde que tem vindo a conquistar.  

 

Os cuidados de saúde prestados por farmacêuticos são o futuro da farmácia e dos cuidados de saúde centrados na pessoa. Cuidados baseados em valor, onde os resultados de adesão à terapêutica, supervisão do estado clínico de doentes crónicos e a satisfação dos utentes são monitorizados e medidos.  

 

Adicionalmente, a adoção de cuidados baseados em valor traz uma consequência há muito reivindicada pelos farmacêuticos: a expansão do seu papel enquanto provedores de serviços de saúde através da integração em equipas multidisciplinares. A colaboração com médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde torna-se uma necessidade. 

Agora que já está detalhada a importância de a Farmácia Comunitária adotar modelos de pagamento baseado em valor, dentro do possível e não sendo extremamente técnico, vamos à realidade.  

 

É fácil alterar o paradigma atual e passar para uma fonte de receita através de cuidados baseados em valor, prestados por farmacêuticos? 

Não. De todo. Até porque não é possível fazê-lo de forma individual e requer o consenso com outras entidades. 

 

É um processo livre de desafios? 

Não. A alteração de modelos de receita implica uma série de desafios, entre os quais: 

- Investimento em formação contínua para os farmacêuticos que vão prestar estes serviços; 

- Promoção de alteração cultural em relação à prestação dos cuidados de saúde, fazendo os utentes perceber que estão no centro e que há um conjunto de profissionais que trabalham em equipa para que tenham melhores resultados, entre os quais se encontram os farmacêuticos; 

- Alteração de políticas de saúde a nível governamental e outras entidades de saúde que integram o sistema de saúde, como as seguradoras, as câmaras municipais, entre outras. 

 

Devo esperar pelo acordo entre entidades para iniciar a prestação destes serviços na minha farmácia? 

Não. Pode ainda não ser comparticipado pelo governo ou outra entidade, mas isso não é justificação para não disponibilizar serviços especializados e cobrar por eles (Cuidados Baseados em Valor).  

 

- Está à espera da comparticipação do governo para iniciar triagem de infeções bacterianas na orofaringe ou no trato urinário? Então, está a perder rendimentos. Em Portugal já há farmácias que o estão a fazer. E sabe que mais? Provavelmente com uma rentabilidade superior à que algum dia irá ser comparticipada. Veja aqui exemplos; 

 

- Está à espera de um acordo governamental para fazer a monitorização de doentes com doenças crónicas, cobrando pelo serviço? Então, está a perder rendimentos. A implementação de programas de seguimento de doenças crónicas, como a diabetes, em que os utentes pagam as consultas por obterem resultados, já é exemplo disso. O Programa Liga-te à Diabetes by KRKA  é disso exemplo. Saiba mais sobre o programa aqui

 

Resta-me constatar o óbvio e que resume tudo o que foi abordado: a adoção de cuidados baseados em valor pelas farmácias comunitárias é essencial para o futuro das mesmas.  

 

Com o acréscimo de resultados mensuráveis, eficiência e qualidade que trazem para o sistema, as farmácias comunitárias e os farmacêuticos fortalecem a sua posição como pilar essencial no sistema de saúde. Aliado a isto, expandem as fontes de rendimento, não ficando completamente dependentes do medicamento, e resolvem um grave problema: o descrédito dos jovens farmacêuticos em relação ao trabalho em farmácia. E não é com promoções, descontos e caixas em troca e de receitas que lá vamos.


Tenhamos em mente que os farmacêuticos do futuro não se reveem no papel de simples dispensadores de medicamentos, mas como parceiros indispensáveis dos utentes e membros das equipas de cuidados clínicos. 

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